Essa é a parte final do meu post tentando explicar o Fractal Fate, a famosa Regra de Bronze. Se você ainda não leu o post da semana passada, melhor correr lá antes de prosseguir 😉
Relembrando da semana passada: talvez tenha passado despercebido uma afirmação minha sobre uma pergunta de um colega meu, o Cavaleiros, sobre como usar venenos em Fate. Bem, esse texto aqui vai realmente explicar o motivo que me levou a citá-la no texto anterior, usando sua resposta para exemplificar como que uma ação pode ser trabalhada diferentemente em Fate, de acordo com sua função narrativa.
Na nossa conversa, a minha primeira reação foi perguntar: “Ah, mas qual a importância do veneno na trama? Por que você pode tratar o veneno de várias maneiras diferentes em Fate.”. E eu vou aqui mostrar como tratar dele de 6 maneira diferentes, usando todas formas de resolução de ações.
Teste simples: essa forma é a que dá menos destaque ao envenenamento. Narrativamente, ela representaria apenas um evento menor, como um opositor tentando Criar Vantagem. Mecanicamente, ela requer apenas uma jogada contra uma dificuldade. No Básico geralmente o alvo usa a perícia Físico para uma ação de Superar, enquanto que outros players podem usar Conhecimento para curar o alvo; no Acelerado dependeria de como se daria o enfrentamento, mas Ágil (fazer um torniquete improvisado) e Poderoso (se livrar na tora, na raça) seriam viáveis para o alvo, enquanto que Cuidadoso (limpar e colocar um unguento na ferida) e Esperto (lembrar do antídoto) seriam possíveis para os outros jogadores. Seria possível incrementar a dificuldade usando uma oposição Ativa, para representar a capacidade do envenenador ou mesmo a potência da secreção de uma criatura.
Disputa: essa é uma forma um pouco* mais complexa de tratar do veneno, geralmente representando uma corrida contra o tempo. Narrativamente, ela pode significar que o tratamento precisa ser realizado de maneira eficiente, antes que o envenenado morra/o efeito seja irreversível ou que é preciso passar por um tempo antes de se ver livre dos seus efeitos. Mecanicamente, será uma série de testes contra a potência do veneno. O lado que conseguir 3 sucessos primeiro vence. Como esse teste pressupõe a oposição Ativa, usar a Passiva torna ele muito, muito repetitivo.
Desafio: essa forma é um pouco mais complexa que a anterior, por exigir diferentes abordagens para se resolver o problema. Narrativamente, ela representa um foco maior no tratamento do veneno, com uma junção de esforços em várias frentes para tentar tratá-lo. Isso poderia significar uma pesquisa sobre a química do veneno, enquanto outra personagem trata dos sintomas do envenenado e uma terceira usa os dados da primeira para sintetizar um antídoto, por exemplo. Mecanicamente, são testes de perícias ou abordagens diferentes, visando um mesmo fim. É possível usar oposição Ativa para diferenciar as atividades (como tentar comprar os ingredientes proibidos do antidoto do boticário local).
Conflitos: essa é a forma mais complexa, usá-la vai consumir um tempo razoável da sessão e, em tese, deveria ser o evento mais importante. Narrativamente, ela representa uma verdadeira batalha contra o veneno, com cada personagem tentando contribuir como pode para superar a química/biologia envolvida na situação. Mecanicamente, seria interessante definir algumas “abordagens” para o veneno e talvez algumas caixas de consequência para cada uma, representando que só focar em lidar com os sintomas só ajudam até certo ponto. Dali em diante é necessário ir atrás de antídoto ou antibiótico mesmo. Oposição Ativa é a regra, mas é possível deixar alguma(s) caixa(s) de stress protegida(s) apenas por uma oposição Passiva, para facilitar ou recompensar os players por sua criatividade.
Porém, o destaque não está apenas naquilo que é enfatizado. Mas, igualmente, está naquilo que nós não favorecemos. E aqui entra a questão do uso diferente da Regra de Bronze: se é possível tratar qualquer coisa como uma personagem, é possível tratar uma personagem (do Mestre, fazer isso com seus players pode ser desastroso) como qualquer outra coisa. Em outras palavras: é possível retirar os holofotes narrativos de alguma atividade tornando sua resolução mecanicamente mais simples. Um exemplo disso acontece em Jadepunk, onde a mecânica de duelos reduz o combate a uma disputa – tornando-o um pouco menos atrativo que o combate normal. Outro exemplo disso seria aquela cena clássica em que o herói atropela todo os minions para chegar no boss final, e o filme atingir seu clímax no combate final. Faz sentido rolar um conflito naquela situação? Por que não pedir apenas um teste de Superar? No seriado Jessica Jones isso acontece: a heroína literalmente pula um “encontro”, aquele logo antes do clímax, com uma simples ação de Superar.
Enfim, já falei demais sobre o assunto.
Espero que ajude na customização dos seus jogos, até semana que vem 😉
*Nota: A dificuldade é mais do mestre (que precisa manejar mais informações e se preparar um pouco mais) do que do jogador. Para este é só uma série de testes, mudar a habilidade testada influencia pouco nessa percepção.